O embarque

O embarque do 1 º Escalão para a Itália ocorreu na noite de 30 de junho para 1 º de julho de 1944, no navio norte-americano General Mann, sob o comando do General Euclides Zenóbio da Costa, num total de 5.075 homens. Junto com o 1 º Escalão, embarcaram o General Mascarenhas de Morais e alguns oficiais de seu Estado-Maior. O grosso da tropa neste escalão era composta pelo 6º Regimento de Infantaria, de Caçapava, SP, e elementos de estado-maior, grupo de artilharia, companhia de engenharia e outros elementos, como manutenção, comunicações, saúde etc.

Contingente da FEB no pátio do atual 31. Grupo de Artilharia de Campanha.
Fonte: Jornalismo de Guerra – Referência externa

 

O 2° Escalão embarcou a 22 de setembro, juntamente com o 3º Escalão, que transportavam, basicamente, o 1º RI e o 11º RI, respectivamente o Rio de Janeiro, RJ, e São João del-Rey, MG. Já o 4º Escalão deixou o Brasil em 23 de novembro e o 5º Escalão partiu em 8 de fevereiro de 1945. Todas as enfermeiras e a maioria dos médicos foram transportados por via aérea.

Havia uma grande preocupação em manter essa operação em completo sigilo, em especial a do 1º Escalão. Os vagões que transportaram a tropa da Vila Militar até o cais do porto permaneceram com as luzes apagadas e janelas fechadas, até o final da viagem. A área de embarque no porto foi isolada com bastante antecedência. Precedendo a partida do General Mann, na noite de 30 de junho, o Presidente Getúlio Vargas e o Ministro da Guerra, Eurico Gaspar Dutra, compareceram a bordo, para apresentar as despedidas aos febianos e lhes desejar sorte, na dura empreitada, que estava por vir.

Enéas Sá de Araújo, que seguiu para Itália no primeiro escalão diz: “Saímos da Vila Militar num trem todo fechado, trancado. Não era permitido abrir nem as janelas. O meu batalhão foi o segundo a deslocar; no dia anterior, já tinha deslocado o 1º Batalhão. A gente não sabia se era exercício ou outra coisa. Quando chegamos ao porto, aquele colosso de navio, de mais de cem metros… Antes de embarcarmos, o Presidente Getúlio Vargas compareceu ao navio e fez um discurso. Do local em que eu estava eu podia ver, e ouvir pelo alto-falante. Lembro que ele disse que podíamos ir despreocupados, pois as nossas famílias não ficariam desamparadas. Em parte, tinha razão, por causa dos nossos vencimentos – a família recebia um terço”.

Severino Raimundo de Oliveira confirma o sigilo que envolveu a operação de embarque: “Na Vila Militar, não se via um civil sequer; a área estava isolada. Fizeram um serviço bem feito! Uns trinta vagões estavam encostados na estação. Em fila indiana, embarcamos no trem, que nos conduziu ao cais do porto”. Samuel Silva justifica a preocupação com o sigilo, dizendo que, “naquele tempo havia muita influência de estrangeiros; tínhamos descendentes de árabes, italianos, espanhóis, portugueses, alemães… Estava proibida qualquer comunicação com agentes externos”.

No depoimento de Vasco Dias Ferreira, que seguiu para a Itália a bordo do General Mann, percebe-se que o sigilo do embarque era relativo. “Eu não ia para casa havia umas duas semanas, mas meu pai soube que embarcaríamos. Ele tinha um bar, perto do cais do porto, que era frequentado pelos estivadores e marinheiros. Disseram a ele que no cais estavam atracados dois navios americanos, os que iriam levar a gente – o 1º e o 11º RI”. Newton Lascalea confirma: “Você não podia se comunicar com ninguém, mandar carta pra família, nada. Consta que pediram para todo mundo que tinha barco sair da Baía da Guanabara; dali a pouco, apareceu aquele monstro do de navio… o sigilo era difícil”.

Segundo Francisco Arthur Gomes “o embarque deu-se em três períodos. Uma parte do pessoal embarcou no dia 28 de junho; o 2º grupamento, ao qual eu pertencia, embarcou em 29 de junho; e o último, em 30 de junho. Aí nos permanecemos no navio até 2 de julho, quando o navio desatracou. Nesse período, entre o embarque e a desatracação, treinamos as medidas e procedimentos para o caso de torpedeamento. Durante o dia, ficávamos no convés. Assim que começava a escurecer, éramos obrigados a nos recolher para os nossos compartimentos”.

Embarque da FEB em julho de 1944 – Marinha do Brasil.
Embarking the Brazilian Expeditionary force, likely July 1944.
Fonte: Flickr – Referência externa

 

Newton Lascalea esclarece como conduziam seus pertences para a guerra: “No saco ‘a’ a gente levava as coisas de uso diário, como escova e pasta de dentes, material de barba etc. No saco ‘b’, algumas outras coisas, como cobertor e roupas mais pesadas”. Recorda ter sido um “dos primeiros a embarcar. Em consequência, fui para o quarto andar inferior. A gente ia entrando e vendo aquelas comportas… Se houvesse algum problema, fechariam as comportas, e estaríamos em maus lençóis. Navio é assim: se dá para salvar todo mundo, ótimo; se não, alguns pagam com a vida para salvar a maioria. Eu estava numa grande desvantagem: em caso de torpedeamento, um ou dois andares seriam sacrificados para salvar os demais. Como eu estava no último…”.

Aribides Rodrigues Pereira passou pela experiência do embarque no dia 20 de setembro de 1944. “Seguimos de caminhão até São Cristóvão, onde dormimos. De madrugada, tocou alvorada. No escuro, em silêncio, embarcamos no trem e seguimos até o cais do porto, onde iniciamos o embarque no navio Gen. Mann”. Os primeiros a embarcar permaneceram o dia e a noite seguintes no navio, enquanto os demais pracinhas (mais de cinco mil) faziam o trajeto até o cais e embarcavam. Ivan Esteves Alves, que também embarcou em 20 de setembro, diz que na entrada no General Meigs havia uma relação de embarque; a cada militar que ia embarcando, tiravam a falta”.

(Depoimentos extraídos de “Vozes da Guerra”, e adaptados pelo autor).